A presidenta da Federação Nacional das Trabalhadoras e Trabalhadores Domésticos participou, no último dia 25 (segunda), junto com o ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto, do Seminário “Trabalhadoras Domésticas: Direitos, Avanços e Desafios”, em Porto Alegre (RS), com o objetivo principal de promover o debate sobre os avanços e as conquistas da categoria trabalhadora a partir da regulamentação e sanção da Lei das Domésticas, além dos desafios na implementação do eSocial.
Matéria originalmente publicada no site Sul21 (http://www.sul21.com.br/jornal/nossa-luta-e-por-dignidade-diz-presidente-de-federacao-em-evento-sobre-trabalhadoras-domesticas/)
Embora seja uma das profissões mais antigas do país — considerada herança do período escravocrata — o trabalho doméstico só começou a ser regulamentado em 2015. As trabalhadoras, em sua grande maioria mulheres negras, tinham direito à carteira assinada desde os anos 1970, mas apenas em 2013 foi aprovada a proposta de emenda constitucional (PEC) que determinou que elas começariam a receber horas extras, adicional noturno e FGTS. No entanto, na prática, isso só foi regulamentado dois anos depois. Para debater a situação dessas mulheres e as necessidades que a categoria ainda enfrenta, o Ministério do Trabalho realizou nesta segunda-feira (25) o seminário “Os direitos das Trabalhadoras Domésticas: Avanços e Desafios”, no auditório do Ministério da Fazenda em Porto Alegre.
O evento teve como palestrantes o ministro do Trabalho e Previdência Social, Miguel Rossetto, a Presidenta da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas, Creuza Oliveira, e o presidente da Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados), Marcos Mazoni. O seminário foi o primeiro de uma série que irá percorrer todas as regiões brasileiras para debater o assunto, em razão do Dia do Trabalhador Doméstico, comemorado nesta quarta-feira (27).
Baiana, Creuza nasceu no interior, onde viveu até ter pouco menos de 10 anos, quando foi para Salvador morar com uma família que prometeu que iria “criá-la”. Na realidade, a menina parou de ir à escola e ficou morando na casa dos patrões, trabalhando como doméstica desde criança. Só conseguiu completar sua alfabetização aos 16 anos. Como ela, muitas outras crianças e adolescentes eram levadas para trabalhar ainda menores de idade, por patrões que consideravam que assim conseguiriam “moldá-las”. Apenas em 2008, após reivindicações da categoria, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou um decreto classificando o trabalho doméstico infantil como parte da lista de Piores Formas de Trabalho Infantil. Depois disso, passaram-se cinco anos até se concretizar a PEC que regularizou a profissão.
Creuza estima que, das mais de 8 milhões de trabalhadoras domésticas existentes no Brasil, apenas 1 milhão estão cadastradas e regularizadas. Ela percebe essa defasagem como uma resistência por parte de certos patrões. “Tem empregadores que dizem que é muito caro. Olha, para quem recebe um salário mínimo, o FGTS é R$ 72, é 8% do salário. Não é nada absurdo. Algumas profissionais estão sendo demitidas, e isso parece ser uma espécie de punição pelos direitos alcançados. Porque a sociedade sempre viu o trabalhador doméstico dentro da lógica da Casa Grande e Senzala, isso é pensamento da época da escravidão”, afirma, acrescentando que espera que com o tempo, a aceitação cresça e a regulamentação seja generalizada.
A categoria é majoritariamente formada por mulheres negras, conforme aponta Creuza, as quais muitas vezes são chefes de família, por isso as trabalhadoras também lutam por creches públicas e escolas em tempo integral. “Nossa luta é por dignidade. Essas mulheres saem para cuidar dos filhos dos patrões e deixam seus próprios filhos sozinhos em casa. É uma pessoa que está dando condições de o patrão trabalhar, uma profissão que tem um valor social muito grande”, destaca. A luta das trabalhadoras começou ainda na década de 1930, mas as conquistas demoraram a chegar, relatou ela.
Atualmente, elas reivindicam que o Brasil assine a Convenção 189 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que estabelece uma série de recomendações a serem cumpridas por quem emprega trabalhadores domésticos. “É uma categoria que trabalha no âmbito privado, que ninguém ouve o que acontece, ninguém vê os assédios morais e sexuais, as violências, a exploração, as acusações falsas. Porque se some alguma coisa da casa do patrão, a primeira a ser acusada é a doméstica”, destaca Creuza.
Nesse sentido, o ministro Miguel Rossetto anunciou que a presidenta Dilma Rousseff ratificou a Convenção e a enviou para aprovação no Congresso na semana passada. “É importante deixar no passado essa relação que não era vista como trabalho pela cultura patriarcal e racista. Direitos estão sendo conquistados e é por isso que existe tanta resistência por parte da elite branca”, apontou.
Segundo ele, até 30% da categoria já está formalizada ou em processo de formalização para conseguir obter todos os direitos. “Quando não é formalizado, as trabalhadoras ganham cerca de 80% do valor do salário mínimo. Mas quando acontece a formalização, a média é de 120% do salário mínimo, ou seja, a partir da regulamentação, temos mais direitos e maior renda”, informou o ministro. Ele lembrou das diferenças de renda entre mulheres e homens, destacando as mulheres negras, que são maioria no emprego doméstico. “As mulheres negras recebem, em média, 40% do que recebem os homens brancos”, afirmou.
Buscando não entrar em detalhes sobre o momento político atual, Creuza apenas lembrou que as conquistas da categoria são devidas também aos governos do PT nos últimos anos. “Ainda não perdi a esperança de nossa presidenta continuar governando nosso país. Temos uma tradição de ser uma sociedade racista, machista, homofóbica, e temos medo de retrocessos”, afirmou.
Veja imagens (Fotos: Camilla Soares/ASCOM MTPS):