A Federação Nacional de Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad) torna público seu repúdio à exaltação ao passado colonial e racista brasileiro pela diretora da Vogue em sua festa de aniversário de 50 anos.
No dia 09 de fevereiro de 2019, a Sra. Donata Meirelles promoveu em Salvador-Ba, no Palácio da Aclamação, uma festa para comemorar seus 50 anos de vida com o tema Brasil Colonial. Na ocasião, ofertou aos seletos convidados da elite baiana e nacional espaço para vivência do período colonial: um trono para sentar e duas mulheres negras vestidas de mucamas para abanar os ilustres convidados.
Repudiamos a atitude da Sra. Donata, ainda que fosse em alusão ao candomblé, pois o culto aos nossos orixás e ancestrais não é símbolo para ser tema de festa.
A iniciativa dessa figura pública escancara a naturalização do racismo e nega as mazelas do período colonial na vida das mulheres negras brasileiras, denunciadas pelo povo negro desde o trajeto nos navios negreiros e por Laudelina Campos já nos idos de 1930 quando fundou a primeira associação de trabalhadoras domésticas do Brasil.
Fomos nós, mulheres negras, obrigadas durante mais de três séculos a servir e abanar as Sinhás em seus aposentos na casa grande e sujeitas a castigos e torturas em caso de desobediência. Fomos nós, mulheres negras escravizadas, obrigadas a servir e atender os caprichos sexuais dos Senhores brancos (ao que Sueli Carneiro denomina de estupro colonial) em suas camas forradas com lençóis brancos passados e engomados com suor e lágrimas de nossas ancestrais.
Somos nós, trabalhadoras domésticas, – categoria formada por mais de 7 milhões de mulheres, em sua grande maioria mulheres negras e pobres -, que lutamos desde o fim da escravidão pela valorização e reconhecimento do trabalho doméstico como trabalho digno e que a figura das mucamas e do quarto minúsculo e escuro de empregada sejam páginas de nossa história para não se repetirem e não para serem exaltadas.
Somos nós, trabalhadoras domésticas, que só em 2013, com a PEC 72, tivemos os direitos trabalhistas equiparados aos demais trabalhadores.
Por tudo isso exigimos I) que a Sra. dedique uma edição da Vogue ao combate ao racismo e à valorização do trabalho doméstico, a título de reparação às mulheres negras; e II) que as instâncias públicas, como o Ministério Público, instaurem de imediato procedimento para averiguação do fato e tomem as providencias legais cabíveis.
Brasília, 12 de fevereiro de 2019.