Chirlene dos Santos Brito, secretária da formação sindical da Fenatrad e coordenadora nacional do Programa, ressalta a importância da iniciativa: “Quando aprendemos, quando temos conhecimento, nunca andamos sozinhas”

Entre os dias 21 e 23 de março, realizou-se o segundo módulo do Programa Trabalho Doméstico Cidadão – região nordeste. Participaram dele 37 trabalhadoras domésticas de seis sindicatos e associações situados na região: João Pessoa/PB, Recife/PE, Aracaju/SE, Salvador/BA, Teresina/PI e Campina Grande/PB. Os trabalhos aconteceram no Centro de Formação e Lazer do Sindsprev (CFL), em Recife/PE, durante dois dias. Na ocasião, as inscritas discutiram o módulo “Direitos das trabalhadoras domésticas”, cujo objetivo é abordar a legislação trabalhista que rege a categoria.

No primeiro dia de evento, as trabalhadoras domésticas iniciaram a manhã com uma visita ao Museu do Homem do Nordeste, local onde conheceram a exposição “ELAS: Onde estão as mulheres nos acervos da Fundação Joaquim Nabuco?”. O conjunto de obras revela a presença feminina na política, arte e história do Brasil. A atividade cultural possibilitou que as inscritas do TDC discutissem assuntos como racialidade e misoginia, bem como os efeitos de preconceitos que se perpetuam há séculos no nosso país. Além disso, nesse espaço, elas puderam conhecer as trajetórias de mulheres, inclusive da sua categoria, que lutaram por direitos e justiça social em diferentes momentos da história.
Entre elas, estavam as amas de leite, cujos retratos compunham a exposição. Durante a escravidão, essas mulheres – em sua maioria, negras e escravizadas – amamentavam os filhos de seus senhores, exercendo um trabalho fundamental para sua sobrevivência. Após a abolição da escravidão, essa prática permaneceu comum. Ainda no Museu, Chirlene dos Santos Brito, secretária da formação sindical da Fenatrad e coordenadora nacional do Programa, iniciou uma breve conversa sobre os desafios vivenciados pelas escravizadas que exerciam funções no interior da casa senhorial. Com isso, as inscritas visualizaram que, há muito tempo, mulheres negras são responsáveis pelo trabalho de cuidados e que a história das babás, uma função exercida por muitas delas ainda hoje, tem suas raízes no passado escravocrata do país.



De volta ao CFL, as educadoras populares Quitéria da Silva Santos e Chirlene dos Santos Brito trataram de legislações nacional e internacional sobre trabalho doméstico. Separadas em grupos, as estudantes foram convidadas a apontar as diferenças entre diaristas e mensalistas, assim como os prejuízos que a categoria sofre quando é enquadrada como Microempreendedora Individual (MEI). Depois, foram discutidas as falhas da Lei Complementar nº 150, de 2015, que, mesmo sendo uma importante conquista para o movimento, é defasada se comparada com as recomendações da Convenção n. 189 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Ao final da atividade, as inscritas sistematizaram as atuais reivindicações das trabalhadoras domésticas em direção à promoção de melhores condições de trabalho no Brasil.


No segundo dia do curso, as inscritas participaram de uma oficina sobre cálculos trabalhistas. Esse é um aprendizado fundamental tanto para o reconhecimento individual dos direitos dessas trabalhadoras quanto para o funcionamento de um sindicato, cujas dirigentes prestam cotidianamente atendimentos para auxiliar outras pessoas a calcularem salários bruto e líquido, aviso prévio, adicional noturno, horas extras, etc.


Já na parte da tarde, as inscritas se dedicaram a estudar a Convenção Coletiva das trabalhadoras domésticas de São Paulo. Nessa cidade, desde 2017, os sindicatos das trabalhadoras domésticas negociam diretamente com sindicatos patronais. Desse modo, tem sido possível conquistar direitos que não estavam garantidos pela Lei Complementar n. 150, de 1 de junho de 2025, como o piso salarial por função exercida e os direitos das migrantes. Após uma rodada de leituras e conversas sobre essa experiência, os grupos encenaram uma negociação coletiva. As propostas foram apresentadas em plenária, onde surgiram temas como vale transporte, plano de saúde e aumento de salário.
Na última atividade do dia, a equipe do TDC organizou uma roda de conversa para avaliação dos conteúdos e da formação até então. As inscritas identificaram que o principal desafio para o estabelecimento de Convenções Coletivas é a ausência de sindicatos patronais na maior parte dos municípios. A expectativa é que esse processo seja facilitado a partir da Portaria nº 1342, de 08 de agosto de 2024, do Ministério do Trabalho e Emprego, que simplificou os procedimentos para registro dessas instituições. Além disso, todas comentaram a importância dos conteúdos discutidos durante o módulo, sobretudo os cálculos trabalhistas, cujo domínio favorece tanto a autonomia pessoal quanto o fortalecimento de suas instituições representativas das trabalhadoras domésticas.
Em fala de encerramento, Chirlene dos Santos Brito, secretária da formação sindical da Fenatrad e coordenadora nacional do Programa, ressaltou a relevância dos momentos coletivos vividos durante o final de semana: “Quando aprendemos, quando temos conhecimento, nunca andamos sozinhas”.